[Verso 1: Dum-Dum] Hoje o ar que cheira sangue amanheceu diferente Não me parece um dia comum, de tiro, velório, felizmente Eu não ouvi os boatos da noite que pa**ou Será que ninguém morreu? Ninguém matou, ninguém matou? Olha o caderno na mão, tem uma tático ali Tem segurança pras crianças indo pra escola Estudar é tão bom quando a morte não está aqui Cadê o mano que trafica perto do portão? Cadê o copo de água mineral? O vestígio das pedras nesse horário sempre tem, só que hoje não Carango cinza, vidro fumê, acho que algo vai acontecer No abaixar dos vidros já imagino os tiros Tenho quase certeza, alguém irá morrer Será que é outro enquadro ou só outro cadáver Qual que é desses can*lhas? Por incrível que pareça vieram em paz Não apertaram o gatilho, não terminou na bala Essa foi de três pontos e que o outro lado, que golaço! Quadra lotada, esporte na mente, caixão adiado A oficina do diabo está ocupada Nos deram boa escola, um centro recreativo, conjuntos habitacionais A nossa gente é sempre lembrada Parabéns Brasil, pela campanha contra o álcool, AIDS, contra as drogas Recuperação em ma**a, o fundo do poço agora tem sua cota Não tem ninguém algemado, a PT está descarregada, tem rango digno no prato Olha o sorriso da tia que pa**a, a sacola é pesada, o suor escorre pela cara Mas o semblante é feliz de quem venceu pelo menos hoje De quem levou comida pra casa Não tem ninguém de roupa imunda e feridas no corpo pa**ando fome Não tem ninguém desempregado metendo os canos Não tem ninguém derrubando ninguém Nem a D20 que pa**ou pro IML não mandou ninguém Pagode, defunto, cerveja na mesa Descontração por alguns minutos Cenário de sangue na batida do pandeiro, treta, caixão, defunto Infelizmente pro demônio hoje não tem velório O anjo protetor nos protegeu, nos livrou do atestado de óbito Nenhuma pedra foi derretida, nenhuma grama de c**aína foi consumida Aqui se valoriza a vida, se incentiva Existe sempre um caminho ou uma alternativa Que cheiro de carniça vem lá da esquina, deve ter defunto Ouvi o som da sirene, não tenho dúvida, mais um fulano no túmulo Até parece que Deus está por aqui Não tem finado nenhum, incomum, sem crack, sem polícia, não é preciso fugir (Despertador) E de repente um barulho de despertador me acordou Infelizmente tudo o que eu vi não pa**ou de um sonho que pa**ou Estou de volta ao inferno Ao enterro, polícia, crack, tiro, papel Fechei os olhos e sonhei com a paz Fechei os olhos e sonhei com o céu [Refrão: Eduardo e Dum-Dum] Fechei os olhos e sonhei com o céu (sonhei com o céu) Do inferno vi a paz (sonhei com o céu) O sangue lá não escorre pelo chão (sonhei com o céu) Não existe cadáver, não se enterra caixão Sonhei com o céu, (sonhei com o céu) sonhei com o céu Sonhei com o céu (sonhei com o céu) [Verso 2: Eduardo] Tem um corpo se decompondo ali no meio do mato Entre mosquitos e sangue o porquê dum finado Daqui a pouco cola a mãe e os familiares Tem uma vela, algumas piadas, alguns populares As lágrimas demonstram o universo contraditório Muita tristeza para uns, pra outros alegria é velório Esse corpo vem da casa de madeira ou papelão Com luz roubada, sem esgoto, sem conforto, segurança, sem opção Esse corpo vem da mesa que sempre tem comida quase de cachorro Que sempre tem migalhas, tem tristeza É outro filho de uma mãe que teve cinco, seis, sete filhos Que criou alguns no cemitério e outros no presídio Foi outro mano que sonhou com roupas caras, boas, um tênis importado Ambição insignificante pro mundo, pra polícia motivo pra ser fuzilado Um outro enterro onde se chora em dobro A morte do fulano, aquela merda onde está o corpo Sem flores, um indigente reconhecível que se vai Sem valor, sem orgulho, só a dor da mãe e do pai Infelizmente é a morte, padrão dos pobres Anoiteceu bum, de qualquer meio do mato, qualquer quebrada, o sangue escorre Quantos de nós sentiremos o inferno na pele? Um corpo com jornal, indigente no IML Uma sepultura abandonada que nunca recebeu sequer uma flor Que nunca recebeu uma visita, uma oração, um gesto de amor Quando não se sonha paz se torna impossível Viver no nosso mundo é foda, é suicídio Um outro homicídio em questão de horas Uma tático que pa**a, outra mãe que chora Das profundezas do inferno quero sonhar com a paz Esquecer toda essa porra de polícia, homicídio, droga Fechar os olhos e sonhar com o céu Fechar os olhos e esquecer que a esperança já está morta Sonhei com o céu [Refrão: Eduardo e Dum-Dum]