[Intro] Alguns às vezes me tiram o sono, mas não me tiram o sonho Por isso eu amo e declamo, por isso eu canto e componho Não sou o dono do mundo, mas sou um filho do dono Do verdadeiro patrão, do verdadeiro patrono [Interlúdio] - E aí, Gabriel, desistiu do cachê? - Cancelei um trabalho aí pra não me aborrecer - Explica isso melhor, o que foi que você fez? - Tá tudo bem, eu explico pra vocês: [Verso 1] Tudo começou na aula de português Eu tinha uns cinco anos, ou talvez uns seis Comecei a escrever, aprendi a ortografia Depois as redações, para a nossa alegria Professora dava tema-livre, eu demorava Pra escolher um tema, mas depois eu viajava E nessas viagens, os personagens surgiam Pensavam, sentiam, choravam, sorriam Aí a minha tia-avó, veja só você Me deu de aniversário uma máquina de escrever Eu me senti um baita jornalista, tchê Que nem a minha mãe, que trabalhava na TV Depois, já aos quinze, mas com muita timidez Fiquei muito sem graça com o que a professora fez Ela pegou meu texto e leu pra turma inteira ouvir Até fiquei feliz, mas com vontade de fugir Então eu descobri que já nasci com esse problema Eu gosto de escrever, eu gosto de escrever, crer, ver Ver, crer, eu gosto de escrever e escrevo até poema [Refrão] Meu Pai, eu confesso, eu faço prosa e verso Na feira eu vendo livro, no show eu vendo ingresso Na loja eu vendo disco, já vendi mais de um milhão Se isso for um crime, quero ir logo pra prisão [Verso 2] - Ih, pensador, isso é grave, hein! É, vovó dizia que eu já escrevia bem Tentei me controlar, me ocupar com um esporte Surfe, futebol, mas não era o meu forte Um dia eu fiz uns raps e achei que tava bom Me batizei de Pensador e quis fazer um som Ficar famoso e rico nunca foi minha meta Minha mãe já era isso, eu só queria ser poeta Meu pai, um homem sério, um gaúcho de POA Formado em medicina, não podia acreditar Ao ver o seu garoto Gabriel Com um fone nos ouvidos viajando com a caneta no papel - O que cê tá fazendo? Vai dormir, moleque! - Ah, pai, peraí, eu só tô fazendo um rap! Ninguém sabia bem o que era, mas eu tava viciado naquilo E viciei uma galera! [Refrão] Meu Pai, eu confesso, eu faço prosa e verso Na feira eu vendo livro, no show eu vendo ingresso Na loja eu vendo disco, já vendi mais de um milhão Se isso for um crime, quero ir logo pra prisão [Verso 3] Não tô vendendo crack, não tô vendendo pó Não tô vendendo fumo, não tô vendendo cola Mas muitos me disseram que o que eu faço é viciante E vicia os estudantes quando eu entro nas escolas Até os professores às vezes se contaminam Copiam minhas letras e textos e disseminam Sementes do que eu faço, já não sei se é bom ou mau Mas sei que muito aluno começa a fazer igual Escrevendo poemas, escrevendo redações Fazendo até uns raps e umas apresentações Me lembro dos meus filhos, a saudade é cruel Solidão me acompanha de hotel em hotel Casamento acabou, eu perdi na estrada O amor que ainda tenho é o amor da palavra É falar e cantar, despertar consciências Dediquei a vida a isso e maior recompensa É servir de referência pra quem pensa parecido Pra quem tenta se expressar e nunca é ouvido É olhar pra minha frente e enxergar um mar de gente E mergulhar no fundo dos seus corações e mentes É esse o meu mergulho, não é o do Tio Patinhas É esse o meu orgulho, escrever as minhas linhas Eu escrevo em linhas tortas, inspirado por alguém Que me deu uma missão que eu tento cumprir bem Escuto os corações, como um cardiologista Traduzo o que eles dizem como faz qualquer artista Que ganha o seu cachê, que é fruto do trabalho De cigarra e de formiga, e eu não sei o quanto eu valho Mas eu sei que quando eu ganho, divido e multiplico E quanto mais eu vou dividindo, mais fico rico Rico da riqueza verdadeira que é de graça Como um só sorriso que ilumina toda a praça Sorriso emocionado de um senhor experiente Em pé há duas horas debaixo do sol quente Ouvindo os meus poemas em total sintonia Eu sou ele amanhã, e hoje é só poesia [Refrão] Meu Pai, eu confesso, eu faço prosa e verso Na feira eu vendo livro, no show eu vendo ingresso Na loja eu vendo disco, já vendi mais de um milhão Se isso for um crime, quero ir logo pra prisão [Outro] - Hei, hei, parado você aí - Quem? Eu? - É, você mesmo. Vai pra onde? - Vou trabalhar - O que que é isso aí? É droga? - Não, mas faz quem usa viajar - É o que? Arma? - Não, mas faz quem usa ser mais forte - Que que cê vai fazer com isso? - Eu vendo isso pra quem tem o poder de compra dos que não podem comprar. E ajudo a aplicar no povo, explico o modo de usar. Eu vendo livros, cara - É um bom negócio? - Honesto e bom, pode crer. E a melhor parte é poder entregar sabendo que alguém vai ler. Tem gente que escreve por ego ou só pra fazer firula. O meu texto é simples, sincero, é tinta que sai da médula. Eu chuto as palavras pra fora e elas que vem me buscar num jogo de bola e gândula - Ãh, entendi. Quanto é? Vê um aí. Vê um desse aí - É 35