Unhas grandes e de vermelho pintadas
Um cigarro sem ter filtro, a esfumar
Na TV duas crianças raptadas
E o inspector, que nada tem a declarar
O seu peito arredondado, quase emerge
À revelia da blusa, que o acolhe
O decote sinuoso não protege
O erege recurvar para quem o olhe
Há baton a mais naqueles lábios ternos
Que na chávena de café, ficam marcados
Os joelhos que se cruzam, são infernos
Para quem espera ainda vê-los descruzados
Em Belgrado estão os pais, num prédio antigo
Manda cartas de saudade e algum dinheiro
Está a aprender o português com um amigo
A Dolores, que é um traveste brasileiro
Faz do strip, a sua arte e o seu brilhar
Ao desejo dos olhares mostra desdém
Despe a roupa, hábil jogo de encantar
Dá-se a todos, mas não a dá a ninguém
Entre o rímel e as sombras sobre as celhas
Nos seus olhos há um luto e, certamente,
Suas formas hão-de um dia estar mais velhas
Quando a vida a for despindo cruelmente.