[Verso 1: Eduardo]
1997, Março, Diadema o Município
Uma câmera, uma fita de vídeo
Mostra pro mundo: Sangue, ignorância, animais com distintivos
Não entendi a surpresa, infelizmente era só um outro dia comum
Dia de enterro, velório, dia que a polícia matou mais um
Não entendi a mídia, nem os políticos imundos, nem a falsa inútil indignação
Afinal era a polícia deles
Fazendo a lei deles
Fazendo o que eles querem, enterrando nosso caixão
Toda noite em São Paulo o sangue escorre
Governador o cúmplice número 1
Pede desculpas na TV, que piada!
Tem um caixão sendo enterrado e uma família chorando a morte
O presidente dá o tom da hipocrisia
Felizmente na PM são a minoria
Não são apenas dez animais nessa maldita corporação
Milhares de a**a**inatos noite e dia, pa**am batido, porque não chegam na televisão
Tenho vários exemplos, vi vários enterros
Eu mesmo fui atropelado mano
Eu mesmo já fiz acerto
Eu vi maluco incriminado, crime forjado
Peteca no bolso, tambor descarregado e outro finado
Se não existe a pena de morte no Brasil
Por que a PM mata tanto?
Principalmente a ROTA, puta que o pariu
CPI do crime organizado, até mudanças de lei na legislação
Tortura: 21 anos, moral ou física? Cadeia pra agressão
Seja bem vindo ao espetáculo da contradição
Tortura sempre foi crime hediondo na constituição
E no entanto, a polícia sempre matou, sempre torturou, sempre mandou pro caixão
O projeto de lei é de 94
De lá pra cá quantos finados?
Milhares de enterrados
E só agora pra mostrar a atitude pra mídia... Demagogia!
O projeto foi aprovado no senado
É tão comum a tanto tempo um cadáver na rua se decompondo
É tão comum a tanto tempo uma família sofrendo por um outro fulano morto
Confiar em quem? Pedir apoio pra quem então?
Se quem é pago pra nos proteger toda noite na nossa gente descarrega um oitão
Mas que porra de polícia é essa? Que não protege
Preto, branco, pobre, favelado
E todo o jovem da periferia é suspeito, candidato à finado
Eu já to cheio de enterro, velório, cadáver cercado de velas
Infelizmente a paz é só embaixo da terra
Não quero a minha mulher com minha filha no colo chorando
Lágrimas de sangue, me enterrando
Sinto muito por todas as vítimas, todas as famílias
Por todas lágrimas de morte arrancadas pela maldita polícia
[Refrão: Eduardo e Dum-Dum]
A lágrima que rola do teu olhar
É tão triste quanto a morte
Tem o cheiro e a cor do sangue
Lágrimas de sangue (Viaturas se aproximam começa o desespero)
Lágrimas de sangue (Será que é minha hora? Eu vou sobrar, ficar inteiro?)
Chega de lei do silêncio, vamos denunciar esses filhos da puta
Gambé não vai pra cadeia, não perde a farda
Ainda te mata na seqüência na rua
Aqui se mata a vítima, se mata a testemunha
Queima de arquivo
Testemunhar é dar visto em atestado de óbito
É bancar o próprio homicídio
Quem me protege dentro de um barraco de madeira ou papelão?
Sozinho na noite contra vários PMs
Contra 12, PT, contra oitão
Ouvidor público me pergunto: Até aonde que isso ajuda?
No país da injustiça o quanto vale a denúncia depois da tortura?
Eu to vendo meu sangue e os meus ossos quebrados, só que ainda eu estou vivo
Não me enterraram agora, não vou correr mais riscos, não vou dar motivo
Talvez até seja errada a minha omissão
Só que a lei do silêncio é conseqüência da falta de proteção... Evita caixão
Se existisse uma câmera filmando perto de todas as táticos
Não seriam só dez dos animais flagrados
A cada, cada noite, o mesmo inferno
Mão na cabeça, encosta aí (ra-ta-ta-ta), cemitério
Não é o salário que transforma um PM em criminoso
É o Brasil hipócrita que no fundo está do lado deles
Que batem palmas quando matam pobres
Que vibram no IML quando chega um corpo
Será que é isso que é justiça?
Será que vamos enterrar pobres mais dois anos
Pra que tirem os benefícios, as regalias da polícia?
E quando a mídia nos abandonar volta tudo de novo
Infelizmente pra nós não é do presidente, nem do governador, o próximo corpo
Queria ver a cara deles num caixão
Uma família chorando do lado, com um gambé sorrindo, soprando um oitão
Esse aqui é o Brasil, contagem regressiva
Eu estou vivo até uma tático atropelar a minha vida
Diadema não é mais que um exemplo
Do que acontece na Zona Sul, Leste, Norte, Oeste, no Centro
A diferença é que lá o cotidiano foi filmado
Só dos finados que eu vi na minha vida, dos que eu contei
Daria um longa metragem de mano enterrado
Faça um role nas periferias, nas favelas, nos cortiços
Verá que o negro tem nome: Polícia, homicídio
A nossa gente tem pouca informação, mas tem memória
Ninguém esquece um tapa na cara, um tiro na cabeça, um caixão descendo nas cordas
Não quero a minha mulher com minha filha no colo chorando
Lágrimas de sangue, me enterrando
Sinto muito por todas as vítimas, todas as famílias
Por todas lágrimas de morte arrancadas pela maldita polícia
[Refrão: Eduardo e Dum-Dum]
[Finalização: Eduardo e Dum-Dum]
Lágrimas de sangue...
Lágrimas de sangue...