Fechou portas e janelas
No escuro da capela, ele se ajoelhou
Salmodiava em pranto
Sempre se perguntando onde foi que errou
O cobre no rabo de um touro
Lhe rasgava o couro, o amor seu coração
Sempre que lembrava dela
Aumentava o volume da voz em oração
Ele um jovem ordenado
De discurso inflamado, pleno em fé e razão
Veio cuidar desse rebanho
Pequeno em tamanho, grande em devoção
Ela, moça inda donzela
Como poucas tão bela, mas de anel na mão
Era a doçura condensada
Em carne bem formada e olhos de clarão
A leva consigo onde quer que ele vá
Se Deus é o amor, quem é que vai lhe salvar?
Aos domingos, nem bem o sol raiava
Ela se aproximava, pedindo confissão
Ele ouvia e não olhava
Mas a voz que falava o tomava em distração
Bem depois que ela partia
Seu coro o traía, enfim era paixão
Deu-se a prazeres solitários:
Meu Deus, sou um vigário, rogo por teu perdão...
A leva consigo onde quer que ele vá
Se Deus é o amor, quem é que vai lhe salvar?
No dia do padroeiro o arraial inteiro, alegre, celebrou
Missa, procissão e festa, jogos, fogos, seresta
A noite enveredou
Mas quando tarde já ia, ele na sacristia
Claro vulto notou, era ela em sua beleza
Mostrando a natureza que até ali a levou
Esse amor que te consome, também arde em mim, breve eu serei de um outro homem, não sou feliz
Acordou no chão gelado
A procurou do lado e não a encontrou
Vestiu o hábito apressado, sentou-se envergonhado
Sorriu, gritou, chorou
Ainda era madrugada, seu peito uma chaga, ele se levantou
Fechou portas e janelas, no escuro da capela, ele se ajoelhou