Meu boné enterrado na cabeça Luvas rasgadas por pedaços de tranqueira Meu macacão já bem velho e bem surrado Estava sempre avermelhado de sujeira Este uniforme era da minha profissão Eu trabalhava com ele a semana inteira Eu catei lixo das favelas e mansões Aproveitei muita coisa abandonada Cortei meus dedos nas garrafas sem gargalos Tremi de frio nas medonhas madrugadas Entrei na igreja com sapatos engraxados Peguei do lixo atirado na calçada Eu nessa lida tive uma grande surpresa Aconteceu numa noite de verão Ouvi um choro baixinho em meus ouvidos Quando eu levava uma tranqueira em minhas mãos
Eu carregava junto ao lixo uma criança Recém nascida enrolada em papelão Larguei de tudo e corri para minha casa Cheguei a tempo, a criança então salvei No outro dia registrei como meu filho Com carinho e muito amor então criei Dei comida, dei um teto e dei estudo Com sacrifício num doutor eu transformei Mais trinta anos depois fui aposentado Meu uniforme de trabalho eu encostei Agora vejo um doutor de roupas brancas Pelo uniforme alaranjado agasalhei Aí está para amenizar a dor humana O grande homem que do lixo retirei(bis)