[Verso 1]
Farto de hospitais, certidões de óbito, brothas no banco dos réus
Barracas, realojamentos fatelas escondidos atrás de arranha-céus
De vigilantes a seguirem-me de loja em loja pelo centro
Tugas a agarrarem as malas nos transportes quando eu entro
De professores a olharem p'ra mim e perguntarem-se o que é que eu faço lá dentro
Ignorando que eu dou no duro p'ra comer, vestir, pagar a renda p'ra estar ali dentro
Por isso que nem sempre eu me concentro
De escolas, serviços públicos, esquadras cheias de racistas
De ser o bode expiatório da direita
Cavalo de batalha de esquerdistas
Tugas a dizerem que hip-hop é a pop que eles dropam no multipistas
De pretos com rimas s**istas, materialistas e gangsteristas
De africanos matarem-se pelo bling que europeus roubam a África
De ver shots e caçulas trocarem com o diálogo e a esferográfica
De ouvir que nós somos a causa dos dias inseguros que se atravessam
Quando eles são a consequência dos atos obscuros que os hipócritas não confessam
Farto de ouvir que a nossa historia é um capitulo da vossa
Quando a vossa só destroçou a nossa
E ainda nos destroça
Farto de vos ver falar dos hábitos e cultura em tom de troça
De ver estrilhos pôr o nosso sangue na poça
Drogas porem brothas na fossa
Crimes porem n***as na choça
Bófias encherem-nos de balas ou coças
Sem k eu possa fazer mais
Do que rimar, cuspir em instrumentais
Devolver à rua p'ra que se possa
Ter noção da mossa
[Verso 2]
Diz-me que não te fartas
Desta vida instável de estar horas a fio na rua paiando quartas
P'ra refeições mais fartas
Enquanto chibos estudam as tuas movimentações p'ra bloquear-tas
E quando te vêem com cem euros a mais já te rodeiam p'ra que repartas
Quando não tens nada ignoram-te, quando tens conspiram p'ra que partas
De cana ou gavetão pondo tua vida em jogo como meras notas em cima de um baralho de cartas
É tal e qual como quando cospes mais fogo que pistolas
Fodendo o sistema em cima de loops, baixos, bombos e tarolas
Entregando knowledge
Que em vez de elevar desce até à inveja as carolas
De fake n***as que querem o fruto daquilo que atinges, enquanto eles curtem e tu te esfolas
Tou farto disso, dos mesmos nomes nos jornais, as mesmas caras na tv, as mesmas vozes na rádio
Tou farto que um preto só seja respeitado em cima de um palco ou dentro de estádio
Num mundo onde o branco que tem poder só abre as portas ao preto que agrade-o
Ao pa**o que o guetto a babylon invade-o
Viola e agride
Farto de construir a riqueza de alguém que comigo nada divide
De construir residências onde o meu próprio povo não reside
De ter crescido com uma cultura, num pais com outra cultura e chegar ao ponto que isso tudo colide
De vê-los guardar p'ró amanhã, se o nosso nem chega pra hoje
De vê-los comer do bom e do melhor, e contentar-me com ovos e arroz
Farto que me envenenem com os seus químicos, medicamentos e comida plástica
De ignorantes raparem a cabeça e tatuarem uma cruz suástica
P'ra tornarem ainda mais drástica
Esta igualdade sarcástica
[Verso 3]
Farto de procurar bules e levar com as portas na face
De picas virem logo p'ra mim naquela que giro no bus sem pa**e
De sentir olhares fulminarem-me quando entro num banco
Não é um a**alto, nem dinheiro mais sujo que o vosso, tão pouco um cheque em branco
Mas aviso que já estou farto de saldo negativo e indisponível
Dá-me gana de carregar este shot e sair p'ra rua, porque honestidade pode dar orgulho, mas orgulho nem sempre é comestível
Indiscutivelmente
Tou farto de ver brothas cheios de talento lutarem sem que uma porta se abra
De ver outros ficarem pragados lá no bairro à espera dum abracadabra
De ver reis e rainhas tratarem-se como um cabrão e uma cabra
E mesmo a**im gerarem uma nova vida nesta terra macabra
Farto de ver a doença dar cabo da mulher da minha vida
De ver putas e filhos delas meter a colher na minha vida
De ser africano, e só conhecer África nas reportagens
Sonhar com aquelas imagens sem conseguir dinheiro p'ras pa**agens
De ver taxistas racistas
Que não me trazem p'ra margem sul de madruga
Farto de Portugal e da mentalidade mesquinha do tuga
Tou mesmo farto
Farto que proíbam abortos e não ajudem as nossas famílias após o parto
Farto de vê-los encher as nossas ruas com as suas toxinas
Do desemprego que deixa brothas agarrados a elas lá nas esquinas
À espera que a merda de um Mac abra ou uma obra comece
Enquanto a renda se acumula e o canuco emagrece