As carrancas do rio São Francisco largaram suas proas e vieram para um banco da rua do Ouvidor. O leão, o cavalo, o bicho estranho deixam-se contemplar no rio seco, entre cheques, recibos, duplicatas. Já não defendem do caboclo-d'água o barqueiro e seu barco. Porventura vem proteger-nos de perigos outros que não sabemos, ou contra a**altos desfecham seus poderes ancestrais o leão, o cavalo, o bicho estranho postados no salão, longe das águas? Interrogo, prescruto, sem resposta, as rudes caras, os lenhados lenhos que tanta coisa viram, navegando
no leito cor de barro. O velho Chico fartou-se deles, já não crê nos mitos que a figura de proa conjurava, ou contra os mitos já não há defesa nos mascarões zoomórficos enormes? Quisera ouvi-los, muito contariam de peixes e de homens, na difícil Aventura da vida de remeiros. O rio, esse caminho de canções, de esperança, de trocas, de naufrágios, deixou nas carrancudas cataduras um traço fluvial de nostalgia, e vejo, pela rua do Ouvidor singrando o asfalto, graves, silenciosos, o leão, o cavalo, o bicho estranho...